terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Banzai #1

Conforme prometido, aqui deixo as minhas impressões sobre o recém lançado número da primeira revista nacional dedicada ao estilo e visual da Manga. Alerto já que não tenho qualquer tipo de interesse ou ligação à revista, além do de mero leitor e que muito menos sou crítico especializado na matéria. Digamos que apenas comprei um exemplar, o li e apreciei e aqui partilho aquilo que o seu desfrute me suscitou.

As estórias
Esta edição retoma as histórias do nº zero, TMG-The Mighty Gang (de Joana Rosda Fernandes) e Kuroneko (de Cristina Dias), obrigando novos leitores a ter de procurar a edição mais antiga porque, especialmente no caso de TMG o resumo incluído é insuficiente para se ter uma noção minimamente decente do que se passou no nº original, sob pena de se perder o proverbial fio-à-meada mesmo considerando a inclusão de um resumo (de novo escrito em Português de rigor duvidoso). Também os diálogos são inconsistentes na maior parte, dando às falas (de novo a escrita…) a sensação de lá estarem apenas para “compor” os desenhos, enfeitarem uns balões e pouco mais, sendo votadas ao triste papel de meros acessórios minimalistas. Como exemplo, basta seguir a quebra na linha narrativa iniciada na página… (esperem, que página é, mesmo? Deixa cá voltar ao início da revista e começar a contar, que os editores esqueceram-se de nos facilitar a vida, imprimindo a respectiva numeração, quer nas pranchas quer nas páginas, elas próprias) 4, em que a Sara pergunta à Joana “Porque queres ir a Inglaterra?” e meia dúzia de quadrados depois esta se parece contentar com a resposta “(…) estou à procura de uma pessoa.” ficando o assunto em suspenso e passando a Sara a outros considerandos. Adiante. Sem querer spoilar demasiado o enredo, a introdução aos poderes de cada um no trio poderiam ser-nos apresentados não tão de supetão, não percebendo bem o porquê da dispersão com que se manifestam ou mesmo da sua coerência (veja-se a luta de Joana Mubarak contra um demónio leonino (sic, juro) com pretextos tão fracos (é fazerem o favor de comprar a revista e lê-la, que mais não conto). O cliffhanger no final da “Missão 03” merecia uma indicação do tipo “Continua no próximo número” bem como a tradução da expressão japonesa com que a Sara se apresenta; a revista não pode dar-se ao luxo de se dirigir somente a geeks, pensando antes que todo o tipo de pessoas (e de todas as idades) a irão potencialmente ler.

Sobre Kuroneko a coisa ainda é mais difícil de descrever. Aquilo que até foi uma boa surpresa, relativamente falando, no número 0, aqui está montada de tal forma e numa sequência tão surreal (é o mínimo que posso escrever) que quase se lhe perde o sentido.


Pandora’s Song
Um destaque especial para a história inédita escrita por Rita Marques, com desenhos desta e de Inês Pott, é o (di-lo a própria revista) “(…) primeiro one-shot de novos autores proposto à NCreatures (…)”. Para mim constitui a suprema surpresa positiva desta edição, dando-me azo a comentar que se aqui se trata de ‘novas obras e novos autores’ (sic), então esta dupla criadora de Pandora’s Song consegue ultrapassar, e à dita légua, as duas obras repetentes na Banzai... Direi mesmo que o preço de capa é só por si justificado à conta delas. Donas de um traço escorreito, elegante e homogéneo, com uma muito subtil sugestão de sensualidade, acompanhado de um bom argumento e ideia originais através de todos os quadradinhos, o enredo tem princípio-meio-e-fim (perdoem-me o lugar-comum). Arrisco mesmo a dizer, algo cinicamente, que as consagradas deste nº 1 da Banzai são efectivamente a Rita e a Inês e não as autoras das duas histórias repetentes. É neste nível de produção e resultados que a revista deve apostar e apontar a sua mira doravante. Digo-o como seu leitor pagante: é isto que quero continuar a ver em edições futuras e é por estes caminhos de exigência e qualidade que a NCreatures deve seguir se quiser sair do nicho de “objecto feito para amigos e conhecidos-de-conhecidos”. Só assim poderá fazer-nos desembolsar futuramente outros tantos múltiplos de €5,50.


Aprender Manga
Volto a dar uma de cínico dizendo que esta nova secção se deveria antes chamar de “Aprender Manga e Bom Português”. Curiosa, mas nada mais há a dizer da sua utilidade. Espera-se mesmo que alguém se torne um artista gráfico especializado no traço à japonesa só porque a acompanhe? Negativo. Não menosprezando o valor do didactismo da ideia, considero que mais bem ocupadas seriam estas 9 páginas se, antes, nelas estivesse impressa outra história curta, no género de Pandora’s Song. Ou os tais novos talentos (no que me concerne sempre pensei que novos eram eles todos e não apenas a Rita e a Inês) não são assim tantos ou de qualidade mínima comprovada para evitar pô-los a NCreatures à espera do nº 2 da revista? Digamos que aqui se trata de um filler (“enchedor de chouriços”, à portuguesa, e desnecessário, repito, mesmo levando em conta que se trata do resultado da colaboração de alguém que dá formação académica no âmbito do Manga).


Showcase
Amostra de dupla página com desenhos de Marta Patalão. De novo, e pela amostra, fico curioso e a perguntar-me como seria uma história completa desenhada por esta autora, de tal forma gostei do resultado. Para mim, mais sentido faz este showcase, do que o dispensável pseudo-didactismo da secção a que me refiro anteriormemte. A repetir, mas apenas se mais nada tiverem para oferecer aos leitores.


Considerações finais
Não bastam uma capa nova-rica e uma impressão em papel decente para se fazer uma boa revista de banda desenhada em estilo Manga, ou outro. Muita coisa há ainda a limar e corrigir em edições futuras da Banzai, isto se a NCreatures quiser aumentar (no mínimo, manter?) uma audiência fiel e interessada no seu produto-de-inspiração-nipónica-em-versão-portuguesa. Para mim continua a ser inadmissível que a língua que usamos para comunicar seja tratada de forma tão amadorística. O seu uso correcto deveria ser revisto e bem analisado antes de ser colocado no papel. Assim como saiu (repito: pela segunda vez) parece mais um fanzine glorificado que uma revista que se quer (?) séria. O tratarmos aqui de um objecto que lida maioritariamente com o desenho não pode ser desculpa para que o texto seja tão displicentemente — ingenuamente? — (mal) tratado. Fico com aquela sensação do "sabe-a-pouco". Resumindo: olhos grandes e onomatopeias apenas não fazem uma obra de manga. Lamento (mas prometo adquirir o #2).




7 comentários:

  1. Não concordo com a apreciação a Pandora's Song. Na minha opinião é uma história que conta pouca coisa mas muito depressa e no fim o que me ficou na cabeça foi "30 páginas para contar só isto?". Acho que as histórias deviam ser mais desenvolvidas e evoluidas. TMG e Kuroneko para mim estão bons (e as "calinadas" no português acontecem até em revistas conceituadas e com muitos anos de mercado.

    Em resumo: Para o tempo que tem está bom, tenho pena é do tempo de intervalo entre cada revista porque faz com que quase nos esqueçamos que ela exista...

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  2. Obrigado por me ler e pelo comentário, que respeito enquanto opinião. Concretamente no caso de Pandora's Song é preciso frisar que se trata de um "one-shot" e, enquanto tal, é suposto, por definição, a história ser contida (e completada) numa única vez. As outras são histórias em continuidade e por isso obedecem a outro ritmo. Para mim, independentemente do nº de páginas que o autor decida usar para contar o enredo, o que interessa é que a menssagem seja passada de uma forma eficaz e que o desenho (razão primeira da existência de uma publicação de BD/Manga) seja tão competente que se "pareça" natural (espero estar a explicar-me claramente). É naquele particular que as outras falham ligeiramente, principalmente (digo eu) devido a uma notória "confusão" na escrita (e não me estou a referir agora ao (in)cumprimento de regras gramaticais elementares).

    Sobre aquilo que refere como "calinadas", é óbvio que todos as cometemos (eu não me excluo deste grupo) mas, pelos dois números já vindos ao prelo, suspeito que se esteja a tornar norma na revista, a falta de cuidado em evitá-las. E mais: a revista em si não será a principal responsável por elas mas (estarei enganado?) as autoras.

    Despeço-me, repetindo o agradecimento pela sua visita e comentário. Volte sempre, não seja estranho. :)

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  3. Olá, obrigada pela critica : ) vamos estar mais atentos a esses pormenores.
    Eu vou falar por mim neste comentário. Não sei se estiveste presente nas apresentações ou não. Mas expliquei que o Kuroneko não possui qualquer tipo de sequência narrativa. Não tem linha de história. (Não sei se conheces Simon's Cat.) É suposto serem apenas sketches humorísticos.
    Ao contrario das outras historias, a minha banda desenhada é para se ler descontraidamente sem se pensar em mais nada se não desfrutar de momentos cómicos e relaxar. Encorajar as pessoas a serem traquinas e pregarem partidas, porque acho que isso é importante para uma amizade saudável, sentirmo-nos à vontade para brincar. Mais nada.

    Muito obrigada pelo apoio ; )

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  4. Ah! e outra coisa, já agora. Nós Fomos recrutadas pela NCreatures pelos nossos portfolios e não porque já os conhecíamos. Mas, mais uma vez, se foste às apresentações devias saber disso. Tudo começou com o projecto Senpai que consiste em recrutar novos talentos a partir de entrevistas e mostra de portfolios. Depois no estúdio vamos trabalhando em conjunto e aprendendo uns com os outros e assim vamos crescendo.
    E talvez para o ano, se ainda estiveres interessado, ainda vejas uma história minha de terror. Esta já terá uma narrativa concreta. Talvez assim te puxe mais pelo interesse do que paginas de gatos e ovelhas a brincar ; )

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  5. Olá Cristina. Antes de mais, cumpre-me agradecer o tempo que despendeste para tecer comentário (s) e esclarecimentos neste humilde espaço (que, caso não tenhas ainda notado, admite logo no cabeçalho conter viagens [mais que] turbulentas). ;) Adiante.

    Lamento não ter estado presente em qualquer das sessões públicas de apresentação da Banzai (refiro-me aos números 0 e 1). Acreditas que só hoje e por via do notas bedéfilas tomei conhecimento da vossa presença no Vasco da Gama? :s Só assim se pode explicar (e espero que a esta luz eu seja lido e entendido) que aquilo que aqui escrevi sobre a vossa obra reflecte, como digo num dos textos, a minha mera e pessoal experiência do leitor que nunca teve acesso a) aos autores (as) e b) pouca ou nenhuma informação pôde retirar da Internet sobre eles (simplesmente porque quase nada existe sobre vocês, que eu tenha localizado online, repito).

    Tal como também aqui escrevi, reconheço a originalidade do projecto (à luz do mercado português, claro) e, porque também é elaborado por "gente nova" (isto é um elogio), merecedor de toda a minha atenção de interessado em BD tout court/Japão/Manga. E a prova do que afirmo é que comprei os vossos 2 números e me dei ao trabalho de sobre eles aqui deixar as minhas humildes considerações (que valem o que valem, sou o primeiro a reconhece-lo). Sempre que uma Banzai chegue ao mercado nacional, prometo comprá-la e “criticá-la” (palavra que me soa a feia, mas tu entendes onde quero chegar). : )

    Seja como for, pretendi fazer uma apreciação informal ao conteúdo e não à forma do trabalho, no teu caso, especificamente, “Kuroneko”. Mas vamos por partes. Conheço e aprecio o Simon’s Cat. Aqui, cada cartoon tem uma ordem, uma estória, uma lógica. Honestamente, e não leves a mal discordar, só mesmo na espécie animal se poderão comparar “Simon’s Cat” e “Kuroneko”; as sequências (pranchas?) escolhidas para o nº 1 do teu personagem não parecem obedecer a uma lógica imediata. E não falo de uma narrativa sequencial, que, logo desde o número zero da Banzai, está claro não existir (como vês, essa parte eu já tinha percebido… hahaha). Para ilustrar o que refiro, explica-me a narrativa subjacente à prancha #3, na página…?? (mais uma vez, a malfadada ausência de numeração nas páginas da revista a tornarem a sua sequenciação um tormento ;p). Imaginemos que o teu contributo no nº 1 consistia somente nesta prancha de 3 quadradinhos. Explica-ma, por favor. :)


    Termino (por agora?) esta resposta, que já vai quase tão longa quanto o meu post inicial, não sem deixar claro (e pedir) que sempre que tiveres alguma novidade sobre o teu/vosso trabalho e se quiseres fazer o favor de mo dar a conhecer ou anunciar, considera (considerem!) este espaço aberto para disso falar publicamente. É o mínimo que, como modesto divulgador, me agradará fazer pelo vosso trabalho. ;)
    Boas estórias e bom manga! : )

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  6. tenho de concordar contigo que as pranchas não foram muito bem escolhidas neste numero. Eu tinha uma sequencia que explicava o gato aparecer com uma camisola e a ovelha sem pelo. Não me perguntaram pela ordem quando paginaram a revista. Numa das paginas da BD o gato está a tecer uma camisola com a lã da ovelha. essa deveria aparecer imediatamente antes desta 3ª o que não aconteceu.
    Mas ainda bem que me avisas que assim não voltará a acontecer tal erro. ; )
    Apesar de não ser comparável ao Simon's Cat num todo, acontece que é uma das minhas inspirações e o tipo de humor é semelhante. Mas em vez de retratar o comportamento de um gato domestico, retrata uma relação de amizade entre dois animais muito distintos. A ideia é apelar à criança que existe dentro de nós. Nada mais.
    A próxima apresentação será dia 18 de Fevereiro em Almada. Também na FNAC. O evento está no facebook como Banzai Tour. Tens lá todas as datas das apresentações. No final da apresentação damos sempre tempo de antena ao público para dúvidas que possam ter. E qualquer pessoa é livre de vir falar connosco depois, pessoalmente.
    Entretanto qualquer dúvida que tenhas podes sempre ir ao facebook da NCreatures e deixar as tuas perguntas. Teremos todo o gosto em responder e teremos em conta as tuas criticas e opiniões : )

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  7. Olá Cristina. Nada tens de agradecer. Se os meus comentários independentes (hahaha) servirem para mostrar a opinião de quem vê as coisas "de fora" e com isso poder contribuir, humildemente, em alguma coisa, eu é que fico satisfeito com isso. Como já entendeste, no fundo o que pretendo é ver uma Banzai cada vez mais forte e única. E também é verdade que "autoras" são vocês e não eu, que me limito a comprar/ler/comentar o vosso trabalho. Neste particular vocês são soberanas e, precisamente enquanto tal, talvez não devessem deixar certos aspectos do resultado do vosso trabalho (árduo, não duvido) inteiramente por mãos alheias; mais atenção à "pós-produção", digamos ;). Talvez devessem acompanhar mais, ou dialogar mais, com a revista, antes de esta ir ao prelo? ;)

    E fica registado o dia 18 de fevereiro! :) Só não prometo, para já, ir porque a minha "praia" (em mais de um sentido...) é a Linha de Cascais e não me desloco muitas vezes à Margem Sul. Mas abrirei uma excepção e tentarei estar presente; mais que não seja para nos conhecermos directamente e não apenas em trocas de "correspondência" digital num blog. :D

    Bons desenhos!

    P.S.: Cristina, agora vejo pela página do Facebook da NCreatures que a apresentação em Almada está agendada para 03 de março próximo (e não 18 de fevº). Podes confirmar qual a data exacta, por favor? Obrigado.

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